‘’ Sempre a vimos como um instrumento civil,
sequer cogitamos que a tecnologia de ponta é monopólio dos militares, a quem
servem, mas, sobretudo, que a servem e cultuam’’. Laymert Garcia dos Santos
Nos últimos textos apresentados nesse blog,
levantei questionamentos sobre a relação entre o militarismo com os
extraordinários avanços tecnológicos alcançados pela produção industrial bélica
e suas conseqüências para a humanidade. Os estudiosos que se propuseram a denunciar
a maquina de morte, que se esconde por tráz dos avanços tecnológicos, são
categóricos ao afirmar que esse movimento representa um retrocesso econômico,
político e social, um desastroso desperdício de recursos. O movimento dessa
maquina de guerra mundial direcionou a sociedade civil a uma nova forma de
colonialismo, o que será apresentado em outro texto. A tecnologia consiste em
uma doutrina de dominação que, submetida ao controle militarista, produz os
elementos necessários para a perpetuação da crise bélica. Em um momento que se
assiste a desvalorização cada vez maior do proletário-trabalhador e do
proletário-soldado, se observa os avanços crescentes do desenvolvimento
tecnológico militar com o triunfo da produção da destruição automatizada.
A tecnologia da destruição submeteu a
tecnologia da produção industrial. Como já foi apresentado em outro texto, o
desenvolvimento industrial atual depende dos avanços da tecnologia bélica, ou
seja, a potencialidade da produção tecnológica de ponta esta voltada à
aniquilação humana, a catástrofe, a barbárie total. Dessa forma, as guerras
atuais se faz no embate e no conflito a nível tecnológico necessitando de
constante desenvolvimento e aprimoramento para o seu maior fortalecimento.
Quando citei que o desenvolvimento tecnológico militar subdesenvolve a sociedade
civil, não é apenas uma relação econômica imposta pela lógica da divisão
internacional do trabalho, representa uma realidade em que toda sociedade civil
humana esta em posição de subdesenvolvimento para que o setor militar continue
a se desenvolver constantemente (VIRILIO, LOTRINGER, 1984, p. 49-68).
Segundo o filósofo francês Paul Virilio, a relação
entre o militarismo com a tecnologia direcionou o investimento da economia
política mundial na economia de guerra e, dessa forma, a guerra passa a ser conduzida
não apenas na sua execução, mas também na sua preparação, o que Virilio
considera como a ‘’Guerra Pura’’. A tecnologia da destruição passa a ser
restrita as engrenagens do sistema da Guerra Pura, e se instaurou um verdadeiro culto
ao desenvolvimento tecnológico militar. A sacralização da tecnologia prossegue
se opondo aos demais avanços tecnológicos e, nesse culto, existem os seus
sacerdotes executores - os militares. Prossegue assim a completa superioridade
da tecnologia da destruição, como demonstrado nas guerras recentes onde se
observou que a persuasão se faz com poder dissuasivo constantemente ampliado a
níveis surpreendentes. Se outrora esse poder de dissuasão era representado
pelos armamentos nucleares, ele então passou a ser ampliado a todos os níveis
de armamentos (VIRILIO, LOTRINGER, 1984, p. 49-68).
A
precisão cirúrgica dos engenhos de alta tecnologia, composto de bombas e
mísseis, que arrasaram a cidade de Bagdá durante a invasão do Iraque em março
de 2003 demonstram que o desenvolvimento tecnológico segue impulsionado pelas
condições de poder desencadear uma guerra e, ao mesmo tempo, de conduzi-la pelo
poder da dissuasão potencialmente ampliado. O sistema de Guerra de preparação e
de execução tem sua própria capacidade de ampliação e de desenvolvimento. Como
já estudamos em outros textos, a conexão entre os industriais e os militares, e
o suporte concedido pela democracia perversa, proporcionou a permanência dos
investimentos na economia de guerra. Mesmo sendo um grande desperdício de
recursos se faz necessário o não esgotamento dos recursos e que haja sempre
recursos disponíveis. Como afirma Virilio : ‘’De um lado, trata-se de não esgotar os recursos; de outro, de não
desenvolver a sociedade civil, porque essa estorva o desenvolvimento da
sociedade militar, os meios de desencadear a guerra’’ (VIRILIO, LOTRINGER, 1984, p.58).
O culto a tecnologia de ponta prossegue pelo
monopólio do uso militar. Os sacerdotes desse culto, no entanto, se tornam também
os inquisidores, aqueles que, periodicamente, voltam essa sacrossanta
tecnologia para a destruição e a barbárie humana. Se outrora a guerra se dava
pela política, pelos guerreiros e pelos seus ‘’aspectos românticos’’, com o
advento das proezas da ciência e da técnica agora a guerra se desenvolve de uma
forma que, segundo Karl Kraus, seu desfecho será decidido de fato numa espécie
de competição entre os laboratórios e fábricas das diversas nações (VIRILIO,
LOTRINGER, 1984). Essas palavras proféticas de Kraus, do início do século XX, são
atuais, na forma que observamos as guerras de hoje, ocorrendo segundo os
interesses das grandes corporações mundiais. Segundo dados do Instituto para Pesquisas
da Paz de Estocolmo – SIPRI, a guerra do Iraque custou três trilhões de
dólares, custo pago pela sociedade civil que padece pela falta de conhecimento
sobre essas questões, sendo que a única forma de haver alguma mudança ainda é o
esclarecimento a todos.
Referências:
VIRILO,
PAUL; LOTRINGER, SYLVERE. Guerra Pura – A militarização do cotidiano. Editora
Brasiliense. São Paulo, 1984. 158p.
SIPRI YEARBOOK 2011,
Instituto internacional de pesquisas da paz de Estocolmo. Disponível em WWW.SIPRI.ORG
Foto: Bombardeio de Bagdá em Março de 2003. disponível em: http://ricardocarelli.wordpress.com/2011/09/15/o-maniqueismo-estadunidense-quem-sao-o-bandidos-no-final-das-contas/. acesso em 11/07/12.