‘’No centro da máquina de guerra
mundial, em movimento veloz, palpita um coração artificial – a tecnologia’’. Laymert
Garcia dos Santos.
Na atual fase do capitalismo, a humanidade passa por um processo de
constante aprimoramento dos meios técnicos e científicos com o extraordinário avanço
das redes de comunicação e informação, inserindo o mundo dentro do sistema
global comandado pelas políticas neoliberais disseminadas, com maior velocidade,
a partir do final dos anos de 1980. Os territórios são invadidos pela
velocidade dos fluxos de mercado sempre eficientes submetendo culturas
e impondo diferentes formas de consumo e hábitos que, muitas vezes, não
condizem com a realidade de um território ou região. Sem dúvida que a
velocidade é um vetor da expansão capitalista atual. No entanto, essa
velocidade não ocorre da mesma forma em todos os lugares e, muitas vezes, nem aproxima os povos e sim, como
veremos a seguir, apenas alguns atores hegemônicos consegue dominar a velocidade
e impor a sua lógica e poder e os demais se submetem aos seus comandos se
tornando passivos diante da hegemonia daqueles que detém o domínio da velocidade
e, conseqüentemente, do próprio poder político.
A enorme crise econômica que afeta o mundo capitalista neoliberal, no
período atual, não significou a diminuição da influência do gigantesco complexo
industrial militar mundial comandado pelas grandes corporações. Muito pelo
contrário, os EUA continuam a ampliar a sua máquina de guerra arrastando outras
nações como China e Rússia a fazer o mesmo. Com o aumento da capacidade da máquina
de guerra chinesa, em resposta aos EUA, outras nações de grandes contingentes
populacionais miseráveis, como a Índia e o Paquistão, provavelmente farão
o mesmo (CHOMSKY, 2009, p.09-48). Esse movimento demonstra a grande velocidade
da máquina de guerra mundial que aparenta ser imune as grandes crises. Enquanto
os governos, em conjunto com as corporações, desenvolvem mais armas altamente tecnológicas com grande velocidade, a população padece com cortes nos gastos sociais e com o
aumento dos impostos. Mas como entender essa realidade em que um setor se
desenvolve constantemente mesmo em período de grave crise econômica o que,
teoricamente, se exige maior gestão das finanças internas e externas dos países?
Para o geógrafo brasileiro Milton Santos, a globalização neoliberal atual
acelerou o processo de expansão contínua e interrupta da técnica e das máquinas. No entanto, apenas
algumas pessoas, firmas e instituições conseguem ser altamente velozes em todo
o tempo e a maior parte da humanidade produz, vive e circula de outra maneira,
ou seja, de forma muito mais lenta e atrasada (SANTOS, 2009, p.121-122).
Sem dúvida que algumas das empresas e instituições que utilizam da maior
velocidade, citadas por Santos, são as corporações do setor armamentista e as
forças armadas das grandes potências. Os incrementos dos meios de destruição
prosseguem com 38 grandes corporações dos EUA produzindo e comercializando 60%
dos armamentos do planeta abastecendo as forças militares do país nas
guerras e mobilizações bélicas ao redor do mundo (CHOMSKY, 2009, p.09-48).
Enquanto se amplia a tecnologia com grande velocidade na produção de novos
armamentos, outros mais ultrapassados são fabricados para atender ao mercado de
exportação de armas de acordo com a lógica da divisão internacional do trabalho, o que ainda estudaremos em outro texto. Para Santos, o uso
extremo da velocidade acaba por ser o imperativo das empresas hegemônicas e não
das demais, e as políticas dessas empresas acabam arrastando a política dos
estados e das instituições supranacionais. No período da globalização atual, as
exigências da competitividade obrigam o aumento da velocidade e assim prevalece
quem tem uma técnica maior e, conseqüentemente, uma velocidade maior, ou seja,
uma técnica hegemônica e uma velocidade hegemônica (SANTOS. 2009, p.123-124).
Milton Santos destaca que as eficácias da velocidade hegemônica não
provem da técnica subjacente e sim da natureza política e do sistema
socioeconômico político em ação. O neoliberalismo acelerou o processo de
submissão da política, o que, segundo o filosofo Frances Paul Virílio, não há
um poder político que possa regular as multinacionais ou as forças armadas que
gozam de autonomia cada vez maior. Dessa forma, devemos relacionar a técnica
com a política para entender o movimento das ações atuais e atribuir novas
possibilidades para o futuro. Se, como já estudamos, ocorre uma monopolização
da tecnologia de ponta ao setor militar, observamos então que a supremacia da
máquina de guerra consiste na submissão do Estado e na submissão da política passando a servir aos atores hegemônicos ligados ao seu desenvolvimento
(LOTRINGER, VIRILIO, 1984, p.49-56).
Mas
porque a política se tornou tão submissa? Onde, nessa perspectiva neoliberal, se encontra a política? Segundo Milton
Santos, na globalização neoliberal a política foi substituída pela política
das empresas atribuindo a morte da política, pois a política deve
obedecer a um conjunto e não a individualidade e o que se observa, no neoliberalismo, é totalmente
o contrário. As empresas, sedentas de lucros, não têm obrigações pelo
conjunto e sim com elas mesmas. No setor armamentista, em constante
desenvolvimento, a importância que alguns estados concedem a produção da
destruição inviabilizam o entendimento que o maior inimigo de suas sociedades é
muito mais interno do que externo. Segundo Virílio, o inimigo é o próprio amamento
e o próprio poderio científico que promove o fim da sociedade humana. A
alienação vem como conseqüência desse processo de velocidade, pois a velocidade
despoja a sociedade de si mesma. O próprio trabalho é suplantado pela produção
da destruição e não se trata apenas de produzir mais depressa e sim da capacidade de
destruir mais depressa (LOTRINGER, VIRILIO, 1984, 157p). A humanidade perdeu o
controle do que a sua própria tecnologia esta produzindo, e o que é pior, a
solidariedade entre os povos se esvazia favorecendo a perpetuação do recurso das armas e
da guerra nas sociedades humanas. O esvaziamento da política é caminho
aberto para as hostilidades e a violência entre os povos. A solução é
trazer o homem para o centro do controle da política e da técnica, conceder e devolver a devida importância a humanidade, o que
estudaremos em outro texto.
Referências:
-CHOMSKY, NOAM. Estados Fracassados – O abuso
de poder e o ataque a democracia. Editora Bertrand Brasil. Rio de Janeiro,
2009, 349p.
-SANTOS, MILTON. Por uma Outra
Globalização. Editora Record. Rio de Janeiro, 2009, 174p.
- VIRILO, PAUL; LOTRINGER, SYLVERE. Guerra Pura
– A militarização do cotidiano. Editora Brasiliense. São Paulo, 1984. 158p.
Foto:
Arte da fotografia. Jato lançando mísseis. Disponível em: http://fotos.fot.br/page_img/10168/jato_lancando_misseis,
acesso em 07/10/2012.