segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Velocidade Hegemônica e Destruição




‘’No centro da máquina de guerra mundial, em movimento veloz, palpita um coração artificial – a tecnologia’’. Laymert Garcia dos Santos.
    Na atual fase do capitalismo, a humanidade passa por um processo de constante aprimoramento dos meios técnicos e científicos com o extraordinário avanço das redes de comunicação e informação, inserindo o mundo dentro do sistema global comandado pelas políticas neoliberais disseminadas, com maior velocidade, a partir do final dos anos de 1980. Os territórios são invadidos pela velocidade dos fluxos de mercado sempre eficientes submetendo culturas e impondo diferentes formas de consumo e hábitos que, muitas vezes, não condizem com a realidade de um território ou região. Sem dúvida que a velocidade é um vetor da expansão capitalista atual. No entanto, essa velocidade não ocorre da mesma forma em todos os lugares e, muitas vezes, nem aproxima os povos e sim, como veremos a seguir, apenas alguns atores hegemônicos consegue dominar a velocidade e impor a sua lógica e poder e os demais se submetem aos seus comandos se tornando passivos diante da hegemonia daqueles que detém o domínio da velocidade e, conseqüentemente, do próprio poder político.
    A enorme crise econômica que afeta o mundo capitalista neoliberal, no período atual, não significou a diminuição da influência do gigantesco complexo industrial militar mundial comandado pelas grandes corporações. Muito pelo contrário, os EUA continuam a ampliar a sua máquina de guerra arrastando outras nações como China e Rússia a fazer o mesmo. Com o aumento da capacidade da máquina de guerra chinesa, em resposta aos EUA, outras nações de grandes contingentes populacionais miseráveis, como a Índia e o Paquistão, provavelmente farão o mesmo (CHOMSKY, 2009, p.09-48). Esse movimento demonstra a grande velocidade da máquina de guerra mundial que aparenta ser imune as grandes crises. Enquanto os governos, em conjunto com as corporações, desenvolvem mais armas altamente tecnológicas com grande velocidade, a população padece com cortes nos gastos sociais e com o aumento dos impostos. Mas como entender essa realidade em que um setor se desenvolve constantemente mesmo em período de grave crise econômica o que, teoricamente, se exige maior gestão das finanças internas e externas dos países? Para o geógrafo brasileiro Milton Santos, a globalização neoliberal atual acelerou o processo de expansão contínua e interrupta da técnica e das máquinas. No entanto, apenas algumas pessoas, firmas e instituições conseguem ser altamente velozes em todo o tempo e a maior parte da humanidade produz, vive e circula de outra maneira, ou seja, de forma muito mais lenta e atrasada (SANTOS, 2009, p.121-122).
   Sem dúvida que algumas das empresas e instituições que utilizam da maior velocidade, citadas por Santos, são as corporações do setor armamentista e as forças armadas das grandes potências. Os incrementos dos meios de destruição prosseguem com 38 grandes corporações dos EUA produzindo e comercializando 60% dos armamentos do planeta  abastecendo as forças militares do país nas guerras e mobilizações bélicas ao redor do mundo (CHOMSKY, 2009, p.09-48). Enquanto se amplia a tecnologia com grande velocidade na produção de novos armamentos, outros mais ultrapassados são fabricados para atender ao mercado de exportação de armas de acordo com a lógica da divisão internacional do trabalho, o que ainda estudaremos em outro texto. Para Santos, o uso extremo da velocidade acaba por ser o imperativo das empresas hegemônicas e não das demais, e as políticas dessas empresas acabam arrastando a política dos estados e das instituições supranacionais. No período da globalização atual, as exigências da competitividade obrigam o aumento da velocidade e assim prevalece quem tem uma técnica maior e, conseqüentemente, uma velocidade maior, ou seja, uma técnica hegemônica e uma velocidade hegemônica (SANTOS. 2009, p.123-124).
   Milton Santos destaca que as eficácias da velocidade hegemônica não provem da técnica subjacente e sim da natureza política e do sistema socioeconômico político em ação. O neoliberalismo acelerou o processo de submissão da política, o que, segundo o filosofo Frances Paul Virílio, não há um poder político que possa regular as multinacionais ou as forças armadas que gozam de autonomia cada vez maior. Dessa forma, devemos relacionar a técnica com a política para entender o movimento das ações atuais e atribuir novas possibilidades para o futuro. Se, como já estudamos, ocorre uma monopolização da tecnologia de ponta ao setor militar, observamos então que a supremacia da máquina de guerra consiste na submissão do Estado e na submissão da política passando a servir aos atores hegemônicos ligados ao seu desenvolvimento (LOTRINGER, VIRILIO, 1984, p.49-56).
  Mas porque a política se tornou tão submissa? Onde, nessa perspectiva neoliberal, se encontra a política? Segundo Milton Santos, na globalização neoliberal a política foi substituída pela política das empresas atribuindo a morte da política, pois a política deve obedecer a um conjunto e não a individualidade e o que se observa, no neoliberalismo, é totalmente o contrário. As empresas, sedentas de lucros, não têm obrigações pelo conjunto e sim com elas mesmas. No setor armamentista, em constante desenvolvimento, a importância que alguns estados concedem a produção da destruição inviabilizam o entendimento que o maior inimigo de suas sociedades é muito mais interno do que externo. Segundo Virílio, o inimigo é o próprio amamento e o próprio poderio científico que promove o fim da sociedade humana. A alienação vem como conseqüência desse processo de velocidade, pois a velocidade despoja a sociedade de si mesma. O próprio trabalho é suplantado pela produção da destruição e não se trata apenas de produzir mais depressa e sim da capacidade de destruir mais depressa (LOTRINGER, VIRILIO, 1984, 157p). A humanidade perdeu o controle do que a sua própria tecnologia esta produzindo, e o que é pior, a solidariedade entre os povos se esvazia favorecendo a perpetuação do recurso das armas e da guerra nas sociedades humanas. O esvaziamento da política é caminho aberto para as hostilidades e a violência entre os povos. A solução é trazer o homem para o centro do controle da política e da técnica, conceder e devolver a devida importância a humanidade, o que estudaremos em outro texto.
Referências:
-CHOMSKY, NOAM. Estados Fracassados – O abuso de poder e o ataque a democracia. Editora Bertrand Brasil. Rio de Janeiro, 2009, 349p.
-SANTOS, MILTON. Por uma Outra Globalização. Editora Record. Rio de Janeiro, 2009, 174p.
- VIRILO, PAUL; LOTRINGER, SYLVERE. Guerra Pura – A militarização do cotidiano. Editora Brasiliense. São Paulo, 1984. 158p.
Foto: Arte da fotografia. Jato lançando mísseis. Disponível em: http://fotos.fot.br/page_img/10168/jato_lancando_misseis, acesso em 07/10/2012.