A
Segunda Guerra Mundial (1939-1945), segundo o historiador argentino Oswaldo Coggiola, foi
um conflito que se caracterizou por uma Guerra Civil capitalista por suas características contra-revolucionárias, sendo o movimento revolucionário
dos trabalhadores russos de 1917 totalmente aniquilado por ambas as
potências envolvidas nos dois lados do conflito. Por outro lado, a Guerra Fria
consolidou um novo sistema ideológico. Os EUA e a URSS, com seus respectivos
blocos, não apenas polarizaram o poder político mundial, mas também impediram
qualquer forma de se estabelecer alternativas a essa política ideológica e antagônica. A impossibilidade
de ocorrer uma oposição efetiva a esse sistema foi assegurada por uma
gigantesca corrida armamentista em ambas as potências e pelo crescimento do
militarismo. Esse fenômeno no pós-guerra possibilitou a ascensão do complexo
industrial militar nos EUA sob a bandeira da democracia, o que vamos analisar
em outro texto juntamente com o estudo das análises de Coggiola.
Nessa
ultima parte do texto, Cook destaca os acontecimentos que deram início a Guerra
Fria e o fortalecimento dos militares na política dos EUA reduzindo à
democracia do país a meras funções eleitoreiras abrindo caminho para o avanço da
militarização da sociedade estadunidense. Outro fator, é a utilização maciça da
propaganda militar. No cartaz acima, os comunistas são estereotipados
como monstros assassinos e devoradores que vão destruir os EUA, representados
pelo inimigo soviético. Cook destaca o enriquecimento acelerado do
pentágono e a influência cada vez maior dos militares e dos industriais na política
dos EUA. Ocorre profundas semelhanças entre a propaganda contra os inimigos da Segunda
Grande Guerra com os comunistas no período da Guerra Fria para intensificar os
gastos militares. Dessa forma, qualquer semelhança com a propaganda da ‘’Guerra ao Terror’’
atual não é mera coincidência. Retornaremos as abordagens das narrativas e análises de Cook.
‘’Um discurso radical
proferido por Virgil Jordan, presidente do instituto nacional de conferencias
industriais em 12 de fevereiro de 1946, exaltaria o povo americano a utilizar a
sua força dominante militar e industrial para dominar o mundo, ou seria dominado
e destruído pelo inimigo – o socialismo. Esses discursos inflamados e a intensa
propaganda patriótica seria a muleta do estado militarista e criaria um poder
eficiente e massificador que se perpetuaria na sociedade dos EUA e nos dias
atuais permanece tão forte como nunca. Especialistas em táticas de propaganda
passaram a trabalhar em conjunto com o pentágono. Cada general e almirante,
cada base e quartel general criara seu próprio departamento publicitário. Em
1947 a marinha contava com 601 especialistas em propaganda. Em 1948 o exército
e a força aérea tinham 810 militares e 557 civis atuando em publicidade. O
pentágono distribuía dez mil fotografias por mês para jornais, revistas,
estações de TV e companhias cinematográficas. Filmes de Cowboy criava antagonismos entre gente boa e má. O slogan da força aérea passou a ser
‘’Força aérea significa força de paz’’. Em 1948, o general Douglas Mac Arthur
tinha cento e trinta e cinco militares e quarenta civis trabalhando como
pessoal publicitário no extremo oriente, o estado maior tinha quarenta e quatro
militares e cento e treze civis cuidando das relações publicas e o comandante
do teatro europeu tinha cento e sete militares trabalhando para divulgar sua
imagem (COOK, 1964, p. 84-88).
A redução do contingente de dezesseis
milhões de soldados para um milhão em 1945 intensificaria a ofensiva dos
militares para a criação de uma força permanente em tempos de paz. Em 1947,
ocorreu à rejeição do congresso ao plano do pentágono de ter um exército de dez
milhões de soldados para um treinamento militar universal, mas a crise de
Berlim provocada pelos russos elevaria a tensão e a propaganda se
intensificaria em que os russos desejavam ‘’escravizar’’ toda a Europa
ocidental. Em 1948 os militares já eram os maiores patrocinadores do radio. Nesse trecho de
O Estado Militarista, o jornalista e
historiador estadunidense Fred. J. Cook destaca as principais estratégias que direcionaram
a sociedade dos EUA a militarização profunda de forma que os militares e o
complexo industrial superariam o poder civil:
Os
lideres da indústria e dos negócios foram convocados para conferencias de
‘’orientação’’, supostamente para serem informados de alguns segredos
militares, e regressaram para suas casas como propagandistas do ponto de vista
dos militares. O departamento de guerra criou uma divisão feminina especial e
dirigiu todo o poder da sua influencia sobre os grupos e associações de
mulheres para ganhar o seu apoio á mobilização dos seus filhos. Histórias em
quadrinhos idealizando a vida militar começaram a aparecer em todos os jornais
para ganhar o apreço das crianças; os colaboradores do radio e da televisão
foram educados para transmitir o ponto de vista militar; oficiais
enganadoramente vestidos a paisana foram colocados entre o publico de programas
e debates para darem aos seus irmãos oficiais, estes em uniforme, as respostas
adequadas às perguntas do palco ou do estúdio; um batalhão de elite
especialmente e especializadamente treinado foi formado em Fort Knox, com o fim
de assistir em peso á missa, sem a presença das mulheres que o influenciasse,
para convencer os padres de que este seria o padrão religioso geral do
treinamento militar universal; e, por ultimo, mas não o método menos ineficaz,
os opositores dos objetivos militares foram representados como sendo
deficientes mentais ou elementos subversivos e, ao mesmo tempo, lançou-se uma
campanha de medo e terror deliberados para convencer o povo americano de que
estávamos virtualmente á beira de uma guerra com a Rússia e de que a nossa
existência nacional estava em jogo (COOK, 1964, p. 94).
Em 1948, o secretario de defesa James
Forrestal em declaração á imprensa afirmaria que a democracia dos EUA foi
fundada sobre uma base de desconfiança pelos exércitos e pela força, e deveria
a população compreender que o exército é parte da população e é de
responsabilidade do cidadão o serviço militar. Passou a ocorrer a inversão dos
papeis em que não havia a responsabilidade dos serviços para com a população, e
sim a responsabilidade da população para com os serviços. Ainda naquele ano o
congresso dos EUA aprovou o plano de treinamento militar universal e, previsto
para durar dois anos, continuaria a partir de 1950 com a guerra da Coréia. As
táticas de propaganda foram fundamentais para esse resultado. Em 1950, o
pentágono possuía mil e oitocentos especialistas em propaganda ao seu serviço
(COOK, 1964, p.89).
Nesse contexto qualquer oposição seria
considerada como subversiva e acusada de falta de patriotismo. Os gastos
militares permaneceriam elevados e os militares se sentiram ainda mais fortes
auxiliados pelo crescimento dos negócios industriais. A decoração democrática
através das urnas seria mantida e as decisões políticas passariam agora a ser
influenciadas e pré-determinadas pelo uniforme. A propaganda atinge os
eleitores e o poder dos militares se sobrepõe as autoridades civis e o
congresso passa a não controlar mais os militares. Os gastos militares explodem
e aumenta a cada ano beneficiando as grandes corporações. O colosso militar
industrial adquiriu, a partir de então, através da ideologia do ‘’inimigo
comum’’ soviético proporções difíceis de calcular. Alguns números são
significativos para comparar o grau de enriquecimento do departamento de defesa
dos EUA, até no inicio dos anos 1960 o pentágono possuía trinta e dois milhões
de acres de terras nos EUA e 2,6 milhões de acres em países estrangeiros, área
superior aos estados de Rhode Island, Delaware, Connecticut, New Jersey,
Massachusetts, Maryland, Vermont e New Hampshire. O prédio do pentágono é muito
maior do que o capitólio, sede do governo do país (COOK, 1964, p. 24).
No governo Eisennhower, os gastos com
defesa foram de quarenta e seis bilhões de dólares anuais e passariam á 57,6
bilhões no governo Kennedy. Os bens dos militares passariam a ser superiores as
grandes companhias civis no período, superando em três vezes o patrimônio total
da United States Steel, American Telephone e Telegraph, Metropolitan Life
Insurance Company, General Motors e Standard Oil de New Jersey. Em
contrapartida com o aumento dos gastos militares, as grandes corporações do
complexo industrial militar arrecadaram bilhões de dólares a cada ano com os
negócios em especial a General Dynamics, a Lockheed e a Boeing. As indústrias militares também empregavam militares em seus
quadros, em uma averiguação em 1961 se constatou que mais de mil e quatrocentos
oficiais aposentados, da patente de major para cima, estavam empregados pelas
cem maiores corporações, incluindo nessa lista estavam duzentos e sessenta e um
generais e almirantes (COOK, 1964, p.25).’’
Para finalizar, a história demonstra
através de trabalhos investigativos e analíticos, como esse documento
de Fred. J. Cook (1911-2003), que a realidade sócio-cultural, econômica e
política da maior democracia desenvolvida do planeta esta fundada nas bases de
um militarismo que a controla. O combustível para o continuísmo desse processo
é a manutenção de um antagonismo que favorece a tensão militar global e, mesmo
após o fim da Guerra Fria, predomina na história atual o surgimento de novos inimigos comuns sempre sob o suporte dos valores da democracia. Uma
democracia associada á uma lógica e um olhar militar. Um modelo que fascina e
assusta pela sua grandiosidade, influência e complexidade, e assim teremos diversos temas para abordar nos próximos textos.
Referências:
COOK,
FRED.J. O Estado Militarista. O
crescimento do militarismo. Editora Civilização Brasileira S.A. Rio de Janeiro.
1964, p.37-65.
COGGIOLA, OSWALDO. Segunda Guerra Mundial: Um balanço Histórico. ed. Xamã/EDUSP. São Paulo. 1995.
Foto: Cartazes de propaganda da Guerra Fria. PaperBlog, disponível em: http://pt-br.paperblog.com/cartazes-de-propaganda-da-guerra-fria-100901/ acesso em 25/02/2012.
Foto: Cartazes de propaganda da Guerra Fria. PaperBlog, disponível em: http://pt-br.paperblog.com/cartazes-de-propaganda-da-guerra-fria-100901/ acesso em 25/02/2012.