‘’As armas e os sistemas de armas nunca são
politicamente neutros.’’ Edward Thompson
As abordagens dos principais estudiosos da questão bélica continuarão a
ser apresentadas por mim nesse blog na forma de diálogos, pois considero ser de
fundamental importância a comparação das opiniões que podem contribuir para o entendimento
da crise bélica atual. Os textos dos autores são bastante atuais na medida que nos aprofundamos nas nossas investigações, pois o movimento da
máquina de guerra mundial prossegue sem qualquer forma de oposição que possa
significar alterações em suas estruturas. Os gastos militares prosseguem
praticamente inalterados amparados pela incessante apologia ao recurso político
militar. No momento em que escrevo esse texto ocorrem 42 guerras abertas no
mundo além de trezentos e quarenta e cinco focos de conflito que podem
desencadear em combates, segundo o Instituto para pesquisas da Paz de Estocolmo
– SIPRI, (SIPRI, 2012).
A economia permanente de guerra, como já estudamos, se consolidou com a
tensão militar em constante ao ponto de submeter à tecnologia de ponta ao seu
total controle. O desenvolvimento militar, desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945),
prosseguiu atraindo cada vez mais investimentos e a tecnologia da aniquilação passou
a adquirir uma dimensão política impondo sua lógica irracional exterminista. A
tecnologia militar direciona a humanidade a destruição total, pois esse é o seu
movimento. A ciência do apocalipse se impulsionou impondo a sua própria
política e o mundo passou a acumular artefatos de destruição de tal forma que
seria suficiente para destruir dezenas de planetas como a terra. Os arsenais
nucleares desenvolvidos pelos EUA e pela ex-URSS eram de 6500 em 1960, passando
a 14200 em 1979 e chegaram a 24000 ogivas em 1985. Esse impulso ao exterminismo
desafia a racionalidade gerando, dentro de si mesmo, um sistema de modernização
e experimentação continua. Se por um lado a presença das armas inibiu um embate
final, que levaria a extinção da humanidade, por outro lado ela significou a
supremacia da máquina de guerra e de sua lógica irracional, além do direcionamento
ao fracasso e a desmoralização da política internacional.
Mas então a que se reduziu a política internacional? Para o historiador
Edward Thompson, a própria política pode se direcionar a militarização: ‘’Os armamentos, certamente, são coisas. Seu
incremento não é independente de decisões políticas. A política, ela mesma,
pode ser militarizada: e as decisões sobre o armamentismo impõem hoje as escolhas
políticas de amanhã. Os armamentos assim se revela, são também agentes
políticos.’’'(THOMPSOM, p.24, 1985). Para o filósofo Paul Virilio, a
máquina de guerra mundial eliminou a guerra política. Dessa forma, a guerra
passa a ser conduzida na transpolítica, o que ele denomina como o começo do fim
do político. Isso significa que diante da presença de uma gigantesca capacidade
militar dissuasiva, o debate político se enfraquece e se esvazia, o que ocupa o
seu lugar é a irracionalidade das armas e o caminho aberto para o Terrorismo de
Estado. Ele mesmo, o Estado, passa a ser terrorista. A tecnologia bélica assim
dita sua própria lei como agentes políticos. (VIRILIO, LOTRINGER, 1984, p.36).
Observamos na atualidade que o poderio tecnológico militar permanece
como alternativa política, e a estrutura da máquina de guerra se perpetua. Os
debates políticos são insuficientes para evitar os conflitos e a própria
concepção política baseada no diálogo, na dialética e na reflexão muitas vezes
se torna impotente e inútil. O extraordinário poderio militar de várias nações
os direcionam ao conflito e ao desprezo pela paz. Na realidade permanecem sobre
a sombra da alternativa militar submetidos ao movimento da máquina de guerra
consumidora de seus recursos. Como afirma Thompson, os sistemas de armas
despreza a paz e a negociação tornando as opções políticas cada vez mais implausíveis. A continuidade de conflitos em diversas regiões do
planeta demonstram que a tecnologia militar superior, de algum lado, alimenta a
ilusão de vantagem e, na maioria das vezes, aniquila o próprio momento da
política diminuindo as perspectivas para a paz efetiva entre os povos
(THOMPSON, 1985, p.15-57).
A herança do sistema exterminista continua predominante. Sua
irracionalidade destrutiva permanece nos sistemas dissuasivos atuais.
Aniquilando o momento da política, a sociedade atual insiste em conduzir as
suas soluções políticas aos militares cujas racionalidades totais são da
guerra. Assim, como os arsenais nucleares do passado, a máquina de guerra atual,
altamente tecnológica, erode continua e constantemente a brecha onde se poderia
utilizar alguma opção política. A ‘’Guerra ao Terror’’ dos EUA, as
desastrosas invasões do Iraque e do Afeganistão, a perpetuação do conflito Árabe-Israelense e o empenho incessante das potências ocidentais
em levar à Síria a uma trágica conflagração total, são alguns dos exemplos que
podemos comparar, mas as conseqüências para a humanidade são ainda mais
onerosas, pois significa o predomínio da racionalidade pelas armas em substituição
a racionalidade política. Sendo assim, o militarismo mundial segue cada vez mais
agressivo e a guerra passa a ser possível como resultado das políticas iniciadas
pelas minorias irresponsáveis – as elites. A máquina de guerra mundial
continua sendo a fonte de privilégios de uma minoria que detém uma riqueza estratosférica como os 1% mais ricos da população dos EUA, o que será estudado em um outro
texto.
Referências:
THOMPSON, EDWARD. Notas Sobre o Exterminismo, o Estágio Final
da Civilização. Coletânea de textos: Exterminismo e Guerra Fria. Editora
Brasiliense. São Paulo. 1985, p. 15-57.
VIRILO,
PAUL; LOTRINGER, SYLVERE. Guerra Pura – A militarização do cotidiano. Editora
Brasiliense. São Paulo, 1984. 158p.
SIPRI YEARBOOK 2011,
Instituto internacional de pesquisas da paz de Estocolmo. Disponível em WWW.SIPRI.ORG
Foto: Teste nuclear com a bomba de Hidrogênio. disponível em: http://www.grupoescolar.com/pesquisa/armas-nucleares.html. Acesso em 01/08/2012.