segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A Ascensão do ''Estado Fortaleza'' (Última Parte)




A Segunda Guerra Mundial (1939-1945), segundo o historiador argentino Oswaldo Coggiola, foi um conflito que se caracterizou por uma Guerra Civil capitalista por suas características contra-revolucionárias, sendo o movimento revolucionário dos trabalhadores russos de 1917 totalmente aniquilado por ambas as potências envolvidas nos dois lados do conflito. Por outro lado, a Guerra Fria consolidou um novo sistema ideológico. Os EUA e a URSS, com seus respectivos blocos, não apenas polarizaram o poder político mundial, mas também impediram qualquer forma de se estabelecer alternativas a essa política ideológica e antagônica. A impossibilidade de ocorrer uma oposição efetiva a esse sistema foi assegurada por uma gigantesca corrida armamentista em ambas as potências e pelo crescimento do militarismo. Esse fenômeno no pós-guerra possibilitou a ascensão do complexo industrial militar nos EUA sob a bandeira da democracia, o que vamos analisar em outro texto juntamente com o estudo das análises de Coggiola.
    Nessa ultima parte do texto, Cook destaca os acontecimentos que deram início a Guerra Fria e o fortalecimento dos militares na política dos EUA reduzindo à democracia do país a meras funções eleitoreiras abrindo caminho para o avanço da militarização da sociedade estadunidense. Outro fator, é a utilização maciça da propaganda militar. No cartaz acima, os comunistas são estereotipados como monstros assassinos e devoradores que vão destruir os EUA, representados pelo inimigo soviético. Cook destaca o enriquecimento acelerado do pentágono e a influência cada vez maior dos militares e dos industriais na política dos EUA. Ocorre profundas semelhanças entre a propaganda contra os inimigos da Segunda Grande Guerra com os comunistas no período da Guerra Fria para intensificar os gastos militares. Dessa forma, qualquer semelhança com a propaganda da ‘’Guerra ao Terror’’ atual não é mera coincidência. Retornaremos as abordagens das narrativas e análises de Cook.
     ‘’Um discurso radical proferido por Virgil Jordan, presidente do instituto nacional de conferencias industriais em 12 de fevereiro de 1946, exaltaria o povo americano a utilizar a sua força dominante militar e industrial para dominar o mundo, ou seria dominado e destruído pelo inimigo – o socialismo. Esses discursos inflamados e a intensa propaganda patriótica seria a muleta do estado militarista e criaria um poder eficiente e massificador que se perpetuaria na sociedade dos EUA e nos dias atuais permanece tão forte como nunca. Especialistas em táticas de propaganda passaram a trabalhar em conjunto com o pentágono. Cada general e almirante, cada base e quartel general criara seu próprio departamento publicitário. Em 1947 a marinha contava com 601 especialistas em propaganda. Em 1948 o exército e a força aérea tinham 810 militares e 557 civis atuando em publicidade. O pentágono distribuía dez mil fotografias por mês para jornais, revistas, estações de TV e companhias cinematográficas. Filmes de Cowboy criava antagonismos entre gente boa e má. O slogan da força aérea passou a ser ‘’Força aérea significa força de paz’’. Em 1948, o general Douglas Mac Arthur tinha cento e trinta e cinco militares e quarenta civis trabalhando como pessoal publicitário no extremo oriente, o estado maior tinha quarenta e quatro militares e cento e treze civis cuidando das relações publicas e o comandante do teatro europeu tinha cento e sete militares trabalhando para divulgar sua imagem (COOK, 1964, p. 84-88).
    A redução do contingente de dezesseis milhões de soldados para um milhão em 1945 intensificaria a ofensiva dos militares para a criação de uma força permanente em tempos de paz. Em 1947, ocorreu à rejeição do congresso ao plano do pentágono de ter um exército de dez milhões de soldados para um treinamento militar universal, mas a crise de Berlim provocada pelos russos elevaria a tensão e a propaganda se intensificaria em que os russos desejavam ‘’escravizar’’ toda a Europa ocidental. Em 1948 os militares já eram os maiores patrocinadores do radio. Nesse trecho de O Estado Militarista, o jornalista e historiador estadunidense Fred. J. Cook destaca as principais estratégias que direcionaram a sociedade dos EUA a militarização profunda de forma que os militares e o complexo industrial superariam o poder civil:
Os lideres da indústria e dos negócios foram convocados para conferencias de ‘’orientação’’, supostamente para serem informados de alguns segredos militares, e regressaram para suas casas como propagandistas do ponto de vista dos militares. O departamento de guerra criou uma divisão feminina especial e dirigiu todo o poder da sua influencia sobre os grupos e associações de mulheres para ganhar o seu apoio á mobilização dos seus filhos. Histórias em quadrinhos idealizando a vida militar começaram a aparecer em todos os jornais para ganhar o apreço das crianças; os colaboradores do radio e da televisão foram educados para transmitir o ponto de vista militar; oficiais enganadoramente vestidos a paisana foram colocados entre o publico de programas e debates para darem aos seus irmãos oficiais, estes em uniforme, as respostas adequadas às perguntas do palco ou do estúdio; um batalhão de elite especialmente e especializadamente treinado foi formado em Fort Knox, com o fim de assistir em peso á missa, sem a presença das mulheres que o influenciasse, para convencer os padres de que este seria o padrão religioso geral do treinamento militar universal; e, por ultimo, mas não o método menos ineficaz, os opositores dos objetivos militares foram representados como sendo deficientes mentais ou elementos subversivos e, ao mesmo tempo, lançou-se uma campanha de medo e terror deliberados para convencer o povo americano de que estávamos virtualmente á beira de uma guerra com a Rússia e de que a nossa existência nacional estava em jogo (COOK, 1964, p. 94).
   Em 1948, o secretario de defesa James Forrestal em declaração á imprensa afirmaria que a democracia dos EUA foi fundada sobre uma base de desconfiança pelos exércitos e pela força, e deveria a população compreender que o exército é parte da população e é de responsabilidade do cidadão o serviço militar. Passou a ocorrer a inversão dos papeis em que não havia a responsabilidade dos serviços para com a população, e sim a responsabilidade da população para com os serviços. Ainda naquele ano o congresso dos EUA aprovou o plano de treinamento militar universal e, previsto para durar dois anos, continuaria a partir de 1950 com a guerra da Coréia. As táticas de propaganda foram fundamentais para esse resultado. Em 1950, o pentágono possuía mil e oitocentos especialistas em propaganda ao seu serviço (COOK, 1964, p.89).  
    Nesse contexto qualquer oposição seria considerada como subversiva e acusada de falta de patriotismo. Os gastos militares permaneceriam elevados e os militares se sentiram ainda mais fortes auxiliados pelo crescimento dos negócios industriais. A decoração democrática através das urnas seria mantida e as decisões políticas passariam agora a ser influenciadas e pré-determinadas pelo uniforme. A propaganda atinge os eleitores e o poder dos militares se sobrepõe as autoridades civis e o congresso passa a não controlar mais os militares. Os gastos militares explodem e aumenta a cada ano beneficiando as grandes corporações. O colosso militar industrial adquiriu, a partir de então, através da ideologia do ‘’inimigo comum’’ soviético proporções difíceis de calcular. Alguns números são significativos para comparar o grau de enriquecimento do departamento de defesa dos EUA, até no inicio dos anos 1960 o pentágono possuía trinta e dois milhões de acres de terras nos EUA e 2,6 milhões de acres em países estrangeiros, área superior aos estados de Rhode Island, Delaware, Connecticut, New Jersey, Massachusetts, Maryland, Vermont e New Hampshire. O prédio do pentágono é muito maior do que o capitólio, sede do governo do país (COOK, 1964, p. 24).
    No governo Eisennhower, os gastos com defesa foram de quarenta e seis bilhões de dólares anuais e passariam á 57,6 bilhões no governo Kennedy. Os bens dos militares passariam a ser superiores as grandes companhias civis no período, superando em três vezes o patrimônio total da United States Steel, American Telephone e Telegraph, Metropolitan Life Insurance Company, General Motors e Standard Oil de New Jersey. Em contrapartida com o aumento dos gastos militares, as grandes corporações do complexo industrial militar arrecadaram bilhões de dólares a cada ano com os negócios em especial a General Dynamics, a Lockheed e a Boeing. As indústrias militares também empregavam militares em seus quadros, em uma averiguação em 1961 se constatou que mais de mil e quatrocentos oficiais aposentados, da patente de major para cima, estavam empregados pelas cem maiores corporações, incluindo nessa lista estavam duzentos e sessenta e um generais e almirantes (COOK, 1964, p.25).’’
     Para finalizar, a história demonstra através de trabalhos investigativos e analíticos, como esse documento de Fred. J. Cook (1911-2003), que a realidade sócio-cultural, econômica e política da maior democracia desenvolvida do planeta esta fundada nas bases de um militarismo que a controla. O combustível para o continuísmo desse processo é a manutenção de um antagonismo que favorece a tensão militar global e, mesmo após o fim da Guerra Fria, predomina na história atual o surgimento de novos inimigos comuns sempre sob o suporte dos valores da democracia. Uma democracia associada á uma lógica e um olhar militar. Um modelo que fascina e assusta pela sua grandiosidade, influência e complexidade, e assim teremos diversos temas para abordar nos próximos textos.


Referências:
COOK, FRED.J. O Estado Militarista. O crescimento do militarismo. Editora Civilização Brasileira S.A. Rio de Janeiro. 1964, p.37-65.
COGGIOLA, OSWALDO. Segunda Guerra Mundial: Um balanço Histórico. ed. Xamã/EDUSP. São Paulo. 1995. 
Foto: Cartazes de propaganda da Guerra Fria. PaperBlog, disponível em:  http://pt-br.paperblog.com/cartazes-de-propaganda-da-guerra-fria-100901/ acesso em 25/02/2012.


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